segunda-feira, 29 de junho de 2009

viva a crise!


Saber ganhar grana não é pecado. Tampouco é virtude
A lógica é simples, não precisa ser muito inteligente para entender. O nome do jogo é “ganhar dinheiro”. E não é só “ganhar dinheiro”, é ganhar mais dinheiro este ano do que se ganhou no ano passado, e mais no ano que vem do que este ano, e no outro mais ainda. É preciso crescer. E é preciso que o ritmo de crescimento cresça também. E até o ritmo do crescimento tem que crescer mais este ano do que cresceu ano passado. E assim se movimenta a economia, e assim se constrói o país, e é por isso que, nas raras ocasiões em que é possível ir a um bar encontrar os amigos, os amigos estão cansados, e perdidos, e esgotados, e trabalhando todo dia até tarde. E você pergunta a eles “como vai a vida?” e eles dizem “está boa, estamos crescendo”, e suspiram desanimados.
É preciso uma crise para nos darmos conta de que isso tudo é insustentável. De que estamos perdendo contato com a vida. De que não lemos mais poesia, e não reencontramos mais os velhos amigos, e não fazemos mais novos amigos, e não pensamos mais na vida enquanto balançamos na rede para lá e para cá. E aí nos damos conta de que deixamos de valorizar o talento, a inovação, a originalidade, a alegria, a novidade, a tradição, a descoberta, a qualidade. Só damos valor para o número frio da linha de baixo da equação. Quanto? Quanto vou ganhar com isso?
Viva a crise econômica mundial! Viva a queda das bolsas! Viva a depressão financeira! Viva o sumiço da grana! Viva a vida pobre e digna, viva as coisas que acontecem por amor, por fé, por esforço irracional, e não por dinheiro.
Sei bem que é absurdo eu dar vivas a uma crise terrível, que certamente vai matar gente de fome e fazer inocentes sofrerem. É terrível que isso seja necessário para chacoalhar a humanidade e mostrar às pessoas que elas estão equivocadas. Mas assim é a vida. Assim somos nós. Às vezes precisamos de um tranco para perceber o quanto somos babacas. Às vezes precisamos de um tapa na cara para entender que uma lágrima, no final das contas, importa mais que 1 milhão de dólares.
Aprecio o valor do trabalho duro. Talvez eu tenha passado tantas madrugadas festejando quanto passei trabalhando, e tive prazer fazendo as duas coisas. Mas o que estava acontecendo até o ano passado não tinha nada a ver com valorizar o trabalho. Valorizava-se a grana. O lucro. A capacidade de saber “monetizar” cada segundo da sua vida. Não acho que saber ganhar dinheiro seja pecado, mas tampouco acho que seja virtude.Enquanto isso, todas os outras qualidades eram menosprezadas. Esse cara é genial? Aquela menina é talentosíssima? Aquele senhor já viu de tudo? Legal, mas o quanto eles são “eficientes”? Quanta grana eles dão?
Não sou contra a eficiência. A bem da verdade, acho que ela ainda precisa crescer muito, tanto no setor público quanto no privado. Mas aquela empolgação financeira que durou até o ano passado deu a sensação de que ela é a coisa mais importante que existe. Tem outras coisas que importam na vida. A crise é uma boa oportunidade para pensarmos nelas.

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